A boa notícia – evangelho – que Mateus nos quer dar a respeito de Jesus – nome que significa Deus dá salvação - não se apresenta nos moldes das notícias que costumamos esperar: Tudo correu às mil maravilhas! Com a bênção de Deus, não houve problema algum! Se Deus é por nós, o mal passa a léguas, e por mais que nos ronde não consegue ferir a nossa tranqüilidade!
Segundo Mateus (Mt 1,18-25), já o casal escolhido para compor a família de Jesus teve de se medir com seus próprios sonhos, enfrentar um profundo conflito humano, que punha em xeque valores fundamentais. Se o casal não supera essa crise, deixando ao amor a palavra decisiva... Em crise também entram os magos (Mt 2,1-12), que têm de fazer outro caminho para sua procura. Em crise, João Batista (Mt 3,1-17), que quer desistir de sua própria missão ao deparar-se com Jesus. Em crise entra o próprio Jesus (Mt 4,1-11), que tem de deixar bem claro, para si mesmo, que veio para fazer a vontade do Pai! E em crise põe Jesus os discípulos que, diante da multidão, se assentam perto dele para ouvi-lo (Mt 5,1-2). De acordo com Mateus, Jesus começa pelas bem-aventuranças.
Jesus nos põe em crise ao afirmar que felizes são os pobres (Mt 5,3). Porque o que mais quer o pobre senão deixar de ser pobre? O pobre se vê como tal quando a ele são negados os bens da sociedade. Vê-se humilhado, por sentir-se excluído na hora da partilha dos bens. Está incluído apenas na hora do suor. E muitos nem nessa hora têm vez, estão proibidos ao mercado de trabalho e ao acesso aos bens produzidos!
Lucas, mais contundente, fala simplesmente do pobre (Lc 6,20), sem ampliar explicitamente para os que se comportam com espírito de pobre.
Dos pobres é o Reino. Dos pobres que não perderam o espírito de pobre. Pertence a eles. E eles pertencem ao Reino. É como se tivéssemos de pedir licença para entrar! O alvará, as vestes para o Reino, são nos moldes dos pobres. Ou nos fazemos como eles, ou aprendemos seu espírito e seu despojamento, ou não passamos a fazer parte do Reino, que é deles por natureza.
A pertença ao Reino não é simplesmente incluir os pobres nos benefícios da sociedade. Isso é um direito deles, mas não é exatamente nisso que consiste o Reino. Jesus nos põe em crise por seus gestos (Mt 4,23; Mt 14,14-21, Lc 19,1-10...) e palavras (Mt 6,24; Mt 15,10-20; Jo 10,10...), porque põe em crise o nosso modo de ser em sociedade. A nossa organização social privilegia uns, exclui outros, põe uns no comando, empurra outros para a subserviência. Assim é a dominação praticada pelos humanos, não o domínio de Deus (Gn 1,28), à sua imagem e semelhança (Gn 1,26).
A felicidade acontece na exata medida em que os pobres puderem alegrar-se, aqui na terra, mantendo o espírito de acolhida, a solidariedade, a partilha. Na medida em que esse espírito der o tom à nossa convivência, na medida em que esse espírito alastrar suas raízes e desafiar a todos.
Se deles é o Reino dos céus, se eles é que melhor retratam o Reino, então aí estão os nossos mestres, então é para eles que precisamos olhar, é com eles que vamos aprender.
Em meio a tantas propostas de felicidade, Jesus também traz uma. A de Jesus é exigente, desconcertante, mas simples e efetiva. Por nossas opções de vida é que se define a nossa escolha.
FONTE: O Artigo de J. Thomaz Filho nos foi enviado diretamente pelo autor.