Antes de olhar detidamente para cada uma das nove bem-aventuranças (Mt 5,3-12), vale a pena ter uma visão de conjunto. Não são peças isoladas para decorar este ou aquele ambiente, à vontade do freguês. Bebem de uma mesma fonte, apontam para um mesmo horizonte, compõem uma mesma unidade, são faces de um mesmo prisma revelando as várias colorações do Novo Reino, que é nossa luz, o grande sonho de Deus que quer ser o nosso presente – presente como dádiva, como dom de Deus, e presente como nosso agora, como nosso constante momento atual, como nossa tarefa, como nosso desafio.
Porque Deus é assim: tem um sonho, que partilha para que seja sonho nosso também – pois nos fez à sua imagem (Gn 1,26-27)! E o sonho de Deus se torna realidade por Sua criatividade, por Suas atitudes, por Seu fazer acontecer. A Bíblia inteira, no Primeiro e no Segundo Testamentos, fala disso! Criados à sua semelhança (Gn 1,26), cabe-nos tomá-lo e agir como Ele.
O sonho de Deus não é para as horas do sono, mas para os suores do dia a dia! Foi para isto que nos criou! Jesus chama de Reino o que o Primeiro Testamento chama de paraíso (Gn 1,1-2,25). É a criatividade de Deus contando com a nossa parceria para tornar-se realidade (Lv 19,2; Mt 5,48; Lc 10,37; Jo 13,34; Jo 15,9-17)!
As bem-aventuranças, em Mateus, mantêm a mesma estrutura, apresentando dois elementos: primeiro, o destinatário; segundo, o que lhe está reservado. Para cada destinatário, uma nova realidade. Entretanto, olhando com cuidado, descobrimos que não são nove destinatários, um para cada bem-aventurança, mas um só, cada um de nós, cada mulher, cada homem, cada jovem, cada criança, cada ser humano! Portanto, todos nós! Ninguém está, por princípio, excluído. O Reino é para todos!
Mas não a qualquer preço. Ou melhor, não sem nenhum preço. O preço é cada um moldar-se como destinatário, assumindo as características dos destinatários das bem-aventuranças, ou seja, ser contado entre os pobres, entre os que choram, entre os mansos, entre os sedentos de justiça, entre os que se compadecem, entre os de coração limpo, entre os artífices da paz, entre os éticos, entre os que assumem a causa de Jesus. O Reino se abre para todos como dom de Deus, mas é tarefa de cada um incluir-se, moldar-se para o Reino, torná-lo presente aqui no nosso chão!
Qual a razão para nos moldarmos dentro desses critérios? Ou, em que consiste o Reino de Deus, do qual nascemos para fazer parte? Ou, em que consiste a felicidade para Jesus, e portanto para nós que nos queremos discípulos seus? Ou, em linguagem popular, o que ganhamos com isso?
É a segunda parte do enunciado de cada bem-aventurança que nos dá essas razões de ser: a eles é que pertence o Novo Reino! Novo porque não envelheceu como os nossos reinos, novo porque mantém a originalidade de Deus, novo porque é dinâmico e se inspira na criatividade de Deus, novo porque é dos filhos de Deus, e Deus não caduca. O Novo Reino é a terra possuída pelo consolo, destronando a injustiça, pautando-se pela misericórdia, que é o coração de Deus, é o lar dos filhos de Deus vicejando entre os humanos, desmobilizando os insultos, a mentira, o mal, a perseguição, a morte. Sonho nosso! E de Deus!
FONTE: O Artigo de J. Thomaz Filho nos foi enviado diretamente pelo autor.