Nacional
Manifestações de 7 de setembro
Após as grandes manifestações que ocorreram no mês de junho em diversas capitais e cidades do interior, as redes sociais e a grande mídia brasileira anunciaram e convocaram novas manifestações para o dia 7 de setembro, Dia da Pátria. Algumas das maiores empresas de comunicação do país mobilizaram um verdadeiro “exército” de jornalistas para acompanhar a cobertura das supostas manifestações: frustação ou desejo que elas ocorressem no volume anunciado?
A perspectiva de uma nova onda de manifestações colocou em estado de vigilância e tensão os governos locais, estaduais e o próprio governo federal, com o receio de que ocorressem confrontos entre manifestantes e forças de segurança, que pudessem abalar novamente a credibilidade e legitimidade das instituições políticas do país.
As manifestações, no entanto, ocorreram, na sua maioria, de forma pacífica e organizada, marcando novamente a presença de setores populares em todas as regiões do país. Vale a pena destacar as manifestações do Grito dos/as Excluídos/as (ver relato no item movimentos sociais desta Análise de Conjuntura), que completou 19 anos, constituindo-se numa referência nacional e até internacional. Neste ano houve um crescimento significativo em termos de visibilidade e de participação popular.
O dia foi marcado também por algumas manifestações radicalizadas por parte de grupos organizados, já amplamente conhecidos, analisados e criticados pela mídia, como autores de “vandalismos” e “agressões contra o patrimônio público e privado”. Tais grupos são geralmente muito pequenos e compostos por jovens que se afirmam “contra o capitalismo”, “contra todos os políticos” e que estão ali para “proteger a manifestação popular”. Suas ações, e o fato de estarem muitas vezes encapuçados, acabaram gerando ações violentas e, inclusive, fortes excessos, por parte de forças de segurança, particularmente das policias militares estaduais.
Ações radicalizadas, por parte de minorias, e repressivas, por parte do Estado, inibem a participação popular dos trabalhadores e trabalhadoras e suas famílias que temem pela integridade física de crianças e de idosos. Deixam, assim, de participar de manifestações populares, que poderiam ter uma visibilidade e significado em termos de cidadania e incidência política em favor da conquista de direitos.
Brasil e a espionagem internacional dos EUA
O episódio da espionagem dos EUA sobre presidentes e outros em países amigos é mais um capítulo atualizado do modus operandi da política externa norte-americana. No caso do Brasil, as informações divulgadas pelo jornalista Glenn Greenwald, parecem revelar que a espionagem atingiu não só a presidente Dilma e assessores diretos, mas empresas brasileiras como a Petrobrás. Tudo indica até aqui que, no mínimo, há um uso de espionagem estatal com interesses políticos e econômicos.
Não é de hoje que as justificativas dos EUA para sua política externa, extrapolando acordos internacionais, não conseguem produzir sentido em seus interlocutores. Assim ocorreu na guerra do Vietnã, no Iraque, no Afeganistão, em Guantánamo (Cuba). Assim foi na operação Condor que apoiou golpes militares, tortura, morte e exílio em vários países da América Latina. É o que pode ocorrer também com um possível ataque à Síria sem acordo na ONU.
A grande mídia brasileira teve uma posição ambígua quanto ao episódio da espionagem. De um lado reforçou a crítica, mesmo que de forma amena, mas em alguns momentos focou mais na fragilidade da segurança das comunicações de autoridades e empresas brasileiras.
Há, nesse momento, um impasse quanto à visita da presidente Dilma aos EUA, dado que as explicações e garantias de que espionagem não ocorrerá mais, não podem ser dadas pelo governo norte americano. Sem saber exatamente o que Edward Snowden ainda tem para revelar, fica difícil fazer qualquer tipo de compromisso. Anteriormente os EUA afirmaram que a interceptação era feita apenas em metadados, mas as revelações mais recentes mostram que também os conteúdos de comunicações foram acessados.
A importância militar, política e econômica dos EUA fazem com que qualquer medida de contraposição do governo brasileiro deva ser muito bem pensada para não se transformar em um tiro no próprio pé. Alguns dos próximos passos poderão dar indicação de que rumo essa questão assumirá nas agendas dos dois países. A informação de que os EUA apoiariam a entrada do Brasil no Conselho de Segurança da ONU, depois de revelados os conteúdos da espionagem, pioraram ainda mais as relações, pois parecem significar uma busca por compensação, sem ter que responder adequadamente pela prática da espionagem. O discurso da presidente Dilma na abertura da Assembleia das Nações Unidas no próximo dia 24 de setembro será um balizador do rumo que o governo brasileiro dará a essa situação.
Câmbio livre, inflação e taxas de juros.
O mercado de câmbio no Brasil é um dos mais livres, seguros e voláteis. Num regime de plena liberdade de movimentos de capitais, a moeda transforma-se como um ativo qualquer, sujeito a todas as formas de manipulação. No mês de agosto, a desvalorização do Real frente ao dólar resultou essencialmente de um novo equilíbrio do mercado devido ao desempenho da economia americana. O cenário global comanda a cotação do dólar no Brasil, mais que a taxa básica de juros domésticos, o crescimento econômico, a inflação ou o déficit em conta corrente. Desde a flutuação do dólar no Brasil em 1999, a demanda global por dólares definiu a cotação da moeda americana. Com a perspectiva de crescimento econômico nos Estados Unidos, “investidores” começaram a retornar ao mercado americano, saindo dos países chamados emergentes. A expectativa de elevação das taxas de juros americanos está provocando uma fuga de capitais dos países “emergentes”.
Quando o Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos, avisou o fim dos estímulos financeiros usados para recuperar o crescimento, as moedas dos “emergentes”, sobretudo daqueles que têm uma forte dívida pública, como é o caso do Brasil, perderam valor frente ao dólar. Por outro lado, esses países (como o Brasil) estão passando por uma desaceleração do crescimento econômico. A inflexão dos preços das commodities teve também impacto sobre os países produtores. Países como Brasil, China e Índia têm que caminhar rumo a um modelo de crescimento mais focalizado no mercado interno.
As reservas em dólares do Banco Central brasileiro foram usadas, não para sustentar o nível da taxa de câmbio, mas para disciplinar a sua passagem ao novo equilíbrio. Com o aviso pelo BC, de um cronograma de leilões da moeda americana, o dólar voltou à casa dos R$ 2,29 no dia 22 de agosto. Mas fica uma incerteza que acompanha o processo de globalização financeira, com o que vai acontecer nos Estados Unidos. Uma plena liberdade dos movimentos dos capitais torna difícil qualquer política cambial.
O aumento do dólar pressionou, sobretudo, os preços de alimentos derivados do trigo como a farinha (2,68%) que tem efeito sobre produtos como o pão. Mas o vilão foi o leite longa vida (3,75%). O clima frio diminuiu a produção e aumentou o consumo. Uma inflação de 0,24% em agosto e de 6,09% em 12 meses não trouxe surpresas. O número está dentro do esperado e com pouco efeito da alta do câmbio. O grupo alimentação vai continuar pressionando em parte por causa da mudança cambial e outra parte pelo efeito sazonal. Apesar de um bom resultado, agentes financeiros apontam e apostam um aumento das taxas de juros. Entretanto, o consumo das famílias no segundo trimestre cresceu pouco (0.3%) sem exercer pressão inflacionista, para crescimento do PIB de 1,5%. Em todo caso, a alta inflação invocada pela grande mídia não resulta numa pressão do consumo das pessoas físicas, mas provavelmente mais na elevação das taxas de juros que endividam as famílias, enriquecendo os agentes bancários e financeiros.
Segundo alguns analistas financeiros, o mercado peca por excesso de pessimismo veiculado pela grande imprensa em manchetes sugestivas: alta inflação, disparada do dólar, déficit em conta corrente... Entretanto, a economia brasileira teve um crescimento de 1,5% no segundo trimestre. O investimento e a agricultura (agronegócio) tomaram o lugar do consumo como alavanca do Produto Interno Bruto (PIB). Mas, segundo projeções de especialistas (os pessimistas) do mercado, este crescimento não deve se sustentar nos próximos semestres, invocando safra menor, juros maiores, inflação, mercado de trabalho mais fraco e real desvalorizado que vão fazer a economia estagnar ou cair 0,5% no terceiro trimestre.
No entanto, o bom desempenho do segundo trimestre fez bancos e consultorias elevarem a projeção para a expansão do PIB este ano para 2,5%. Para 2014, as expectativas seriam piores por causa do impacto negativo do aumento da taxa de juros. O destaque da expansão foi o investimento com maior produção de máquinas e equipamentos, proporcionando uma recuperação na indústria. Mas, os entendidos do mercado, para os quais a taxa de inflação de julho (0,03%) era atípica, falam agora de calendário atípico para o crescimento do PIB no segundo semestre, apontam uma retração nos meses de julho e agosto em razão do mercado de trabalho aquecido, excesso da demanda doméstica, pressões inflacionárias e alta de juros. No entanto, a Confederação Nacional da Indústria projeta para este ano uma alta de 2,6% do PIB industrial. Entre 2008 e 2012, o faturamento das 50 maiores empresas brasileiras cresceu bem mais que o PIB. Houve um aumento significativo do faturamento e da lucratividade das empresas depois de cinco anos de crise global.
Julgamento dos recursos às decisões sobre a ação penal 470 no STF.
Com o fim do recesso de julho do Supremo Tribunal Federal, a sociedade brasileira foi inundada com termos jurídicos de pouco (ou nenhuma) compreensão para a maioria dos cidadãos: embargos de declaração, embargos infringentes acerca das decisões tomadas no julgamento da Ação Penal 470, conhecida como “Mensalão”.
A espetacularização patrocinada pela grande mídia brasileira (MCS) ao julgamento do Mensalão às vésperas das eleições municipais de 2012 está chegando ao extremo com a exposição de detalhes mínimos que não têm significado algum, a não ser o de influenciar as decisões que se tomam no STF. São horas de transmissão direta do Tribunal em rádio e TV de termos jurídicos incompreensíveis, mostrando a distância entre a linguagem do direito e a língua corrente da população.
São dois julgamentos simultâneos: um da referida ação penal; outro a que cada juiz é submetido. Cada decisão dada é analisada por “especialistas” nos grandes meios de comunicação classificando-os ou “como juiz a favor dos bandidos” ou como “juiz a favor da opinião pública”.
Esse “espetáculo patrocinado” serve para a condenação pública da política, visto que gera cansaço e descrença na possibilidade de mudança no sistema político brasileiro. É preciso lembrar que já se organizaram várias iniciativas populares de lei, visando sobretudo dar maior transparência na utilização dos recursos públicos e na limitação de utilização de volumosos recursos financeiros em campanhas eleitorais, que está na raiz da corrupção.
Está cada vez mais difícil interpretar o resultado em termos de mudança concreta no sistema político brasileiro a partir da decisão tomada pelo STF. Perde o Poder Judiciário, pela linguagem desconhecida, perde o povo brasileiro que não consegue perceber os efeitos concretos para acabar com a corrupção no Estado brasileiro que a decisão poderá trazer.
Reforma Política: um momento novo?
Na conjuntura de agosto apresentou-se os passos dados em prol de uma Reforma Política democrática. Após longos debates, as entidades da sociedade civil chegaram a cinco pontos de consenso: a) afastar o poder econômico das eleições; b) mudar o sistema eleitoral; c) aperfeiçoar a democracia direita; d) aprimorar a representação da sociedade na política; e) melhorar o sistema partidário.
A partir destes cinco aspectos foi constituída uma “Coalizão pela Reforma Política democrática e eleições limpas”. A nova entidade escolheu uma equipe de entidades como coordenação com dupla missão: 1ª) preparar um ato cívico, na sede da CNBB, convidando um grande número de entidades, sobretudo representadas pelos seus próprios presidentes; e 2ª) elaborar uma proposta de Projeto de Lei para entregar ao Presidente da Câmara dos Deputados.
Entretanto, o Congresso Nacional, Câmara e Senado, continua, em passos lentos, com a tramitação de Projetos de Reforma, mais eleitoral do que Política, em comissões específicas de trabalho. A legislação atual, contudo, exige um ano de antecedência das eleições para uma lei aprovada ser aplicada. Neste caso, o dia “D” para a votação do resultado dessas comissões serem válida para as eleições de 2014 é 5 de outubro próximo. Haverá alguma decisão nova do Congresso para as próximas eleições?
Os dois eventos previstos pela Coalizão foram realizadas no mês de setembro:
1)O Ato público realizou-se no dia 03 de setembro, em frente à sede da CNBB. Um momento republicano com a presença de, mais ou menos, 400 pessoas, representantes de 43 entidades expressivas da sociedade civil como assinantes de um Manifesto por uma Reforma Política Democrática lida na ocasião.
Compareceram como apoio ao Ato os participantes da Semana Social Brasileira em andamento em Brasília, a Frente Parlamentar mista com participação popular, vários senadores e deputados/as.
O Manifesto supramencionado resume a perspectivas das entidades: inicia-se com a reflexão com vários “considerandos”, depois “proclamam” e “conclamam”. Entre os “considerandos” destaca: “o baixo nível de credibilidade dos poderes legislativo, judiciário e executivo, conforme pesquisas de opinião; distorções dos sistemas político e eleitoral alargando o fosso entre o Estado e a Nação, entre os representantes e representados...” Diante dos fatos contemplados, proclamam a decisão da união das entidades formando uma coalizão para desencadear uma campanha cívica pela imediata Reforma Política. E mais, conclamam o povo brasileiro a participar da Campanha.
Todo o Ato público foi coordenado, por Dom Joaquim Mol, presidente da Comissão pela Reforma Política da CNBB, que já vem indicando os passos para chegarmos a esta Coalizão, por escolha das entidades.
Entrega da proposta de Projeto de Lei ao Presidente da Câmara, no dia 10 de setembro, na sala da presidência. Após tentativas de várias fontes de comunicação, conseguiu-se agendar uma audiência com o chefe do Legislativo para apresentá-lo, no formato de Projeto de lei, as aspirações de uma Reforma Política democrática. O momento foi precedido pela entrega do Manifesto supracitado e o texto do Projeto de Lei em todos os gabinetes, também solicitando assinatura como apoio ao Projeto e convidando para se fazer presente ao ato de sua entrega ao Presidente da Câmara.
Cento de trinta parlamentares fixaram sua assinatura e sessenta deles, de todos os partidos, corresponderam ao convite no momento do ato comum como solidariedade ao trabalho das entidades.
Dom Joaquim Mol explicitou as preocupações das entidades e a intenção de fazer tramitar o Projeto a ser válido ainda para as eleições de 2014. Emprestou a credibilidade das organizações aos parlamentares.
O presidente da Câmara, deputado Henrique Alves, após escutar com atenção a sociedade civil, fez um longo discurso e assumiu alguns compromissos: a) pessoalmente entregaria o Projeto à Comissão de trabalho sobre a Reforma Política na próxima quinta feira. De fato, não o fez ainda e quando um deputado citou na reunião o fato do encontro das entidades com o Presidente da Câmara e seu motivo, recebeu o silêncio como resposta; b) também prometeu audiências públicas na comissão com a presença da sociedade civil.
Por sua vez, as entidades continuam mobilizadas e tomaram novas iniciativas: a) criação de um Comitê de Comunicação com pessoas das entidades que lidam com o tema. Para surpresa das entidades, não houve nenhuma repercussão na grande imprensa a mobilização da sociedade civil: o que significa o silêncio da Mídia num momento em que tem dado ênfase a casos de corrupção? b) realizar atos públicos nos Estados mediante a criação de uma Coalizão das entidades, utilizando painéis visualizando os parlamentares que já aderiam ao Projeto; c) no final da audiência, o Deputado Henrique Fontana tomou a palavra para sugerir que a semana de 22 a 27 de setembro fosse dedicada ao projeto apresentado; d) para isso, será necessária a solicitação de uma audiência com a Presidência da República para explicitar as aspirações com uma Reforma Política democrática, ainda para 2014. Deve ser feito um pedido que a Presidente retire a urgência do Projeto do executivo para facilitar a tramitação do atual.
Se todas essas tramitações forem frustradas, a Coalizão se propõe encaminhar um Projeto de Lei de iniciativa Popular a partir da coleta de assinaturas.