As questões ligadas à democracia e ao sistema eleitoral têm estado muito presentes os últimos dias, por distintas razões que justificam aproveitarmos nosso comentário semanal para tratar deste tema. Como é sabido, o povo é o soberano do poder político. Ao votar e, dentro de determinadas regras, eleger os titulares, o povo escolhe determinados candidatos que, eleitos, passam a exercer um mandato outorgado pelo povo, o que significa que a população deposita confiança na realização de suas propostas, geralmente apresentadas e discutidas por ele e pelo partido ao qual ele está filiado, junto à população, especialmente durante o período eleitoral.
Este assunto tem estado muito presente nos últimos dias por diferentes motivos, alguns dos quais apresentaremos a seguir. Ao final, vamos retomar um aspecto desse tema que vai ficando mais próximo do conjunto da população, ou seja, as eleições municipais, ressaltando a importância cada vez maior da viabilização de uma reforma política que aprimore nosso sistema político, melhorando as regras eleitorais e, por essa via, aproximando cada vez mais as eleições e os eleitos da vontade soberana do povo.
O primeiro fato a relatar reflete o impeachment, o impedimento da continuidade no poder do Presidente Lugo do Paraguai, fato este largamente noticiado nos últimos dias pelos meios de comunicação. Impedido, assumiu o vice-presidente que, neste caso, é um político de idéias e projetos políticos muito diferentes daquele que foi eleito pelo povo do Paraguai. O presidente deposto Fernando Lugo discordou completamente do argumento da legalidade de seu afastamento, afirmando que este afastamento guarda semelhança com a deposição do Presidente Zelaya, em Honduras, três anos atrás, quando grupos políticos “armam o bote” e utilizando leis e decisões legislativas apressadas, ou detendo a maioria parlamentar, utilizam-se de casuísmos e armadilhas jurídicas para cassar e trair a vontade popular. Só a constatação de que o Presidente não teve assegurado o direito à sua defesa e de que todo o processo de julgamento durou menos de três dias, deixa clara sua fragilidade. Esse fenômeno tem sido chamado de “neogolpismo”, e seria uma nova forma de trocar os governantes sem intervenção militar e sem uso de armas. Há mais algum tempo havia acontecido outra tentativa, pelos opositores do Governo Chávez, na Venezuela, inclusive, com a participação política dos Estados Unidos. Sem maioria no Parlamento, o presidente destituído, Fernando Lugo, descreveu seus opositores como “grupos que nunca mostram os rostos” e os vinculou "à classe política tradicional que não aceita que nesse país podem existir práticas políticas diferentes, práticas políticas que não se baseiam no clientelismo ou em vantagens".
O segundo tema enfocado repercute artigo recente da Deputada Luiza Erundina, intitulado “A origem da barganha eleitoral no Brasil”. Escrito com a finalidade de dialogar com a opinião pública a respeito das falhas do sistema eleitoral, ela usa o exemplo de sua desistência de ocupar o lugar de candidata a vice-prefeita do candidato Fernando Haddad, em São Paulo, devido, especialmente, ao grande impacto simbólico da publicação da foto em que Lula apertava as mãos do deputado Paulo Maluf, em sua ostensiva Mansão, selando o apoio do PP à candidatura do PT. Achamos importante a reflexão da deputada porque ela chama a atenção para a dimensão pedagógica, sobretudo para os jovens, da política, afirmando que as “ações e atitudes de lideres tenham como perspectiva não apenas a conquista do poder, mas também elevar a consciência e a politização da sociedade.”
A outra lição do lamentável episódio, segundo a ex-prefeita, é o de “colocar na agenda da sociedade o tema da reforma política e mobilizar forças sociais e políticas para pressionar o Congresso a aprovar uma reforma política que não se restrinja a simples mudanças nas regras eleitorais, como tem ocorrido, mas que repense o sistema político como um todo.” De fato, o Brasil está refém de regras eleitorais que distorcem a vontade popular, como as regras das coligações e o atualmente vigente financiamento privado das campanhas.
A cada legislatura, o Congresso promete e ensaia algumas tentativas que logo se frustram. O debate tem ficado circunscrito a poucos parlamentares e não se consegue consenso sobre aspectos fundamentais de uma verdadeira reforma política. Assim, nos lembra a Deputada que, ao se iniciar a atual legislatura, o tema da reforma política voltou à agenda do Congresso, estimulado pelo discurso da presidente Dilma na sessão de instalação dos trabalhos legislativos, em fevereiro de 2011, tendo sido criadas duas comissões especiais para elaborar e apresentar propostas de reforma, uma no Senado, outra na Câmara ao mesmo tempo em que se recriou a Frente Parlamentar pela Reforma Política com Participação Popular, composta por deputados e dezenas de entidades da sociedade civil.
Estas duas análises tornam-se oportunas pois, como recentemente afirmou Caci Amaral em artigo publicado no Blog da Pastoral Fé e Política, “estamos no período do ano eleitoral no qual os partidos realizam as convenções para escolha do candidatos ou candidatas a prefeito, vice-prefeito, vereadores e vereadoras e decidem, também, se vão fazer coligações e com quais partidos”. Até dia 05 de julho, os nomes daqueles que vão concorrer às eleições deverão ser entregues nos cartórios eleitorais. Trata-se de um momento muito especial no qual a população como um todo e, especialmente as comunidades mais organizadas, precisam ficar muito atentas para as definições políticas, relativas aos candidatos a prefeitos e vereadores, observando as coligações que os irão lançar e quem são os candidatos apresentados à sociedade.
Nessa linha, o MCCE (Movimento de Combate a Corrupção Eleitoral) lançou os modelos de petições de impugnação de registro de candidatos “ficha suja”. Qualquer cidadão pode e deve comunicar eventual irregularidade identificada do candidato “ficha suja” ao Juiz Eleitoral. O MCCE preparou um modo mais correto e legal de se fazer a manifestação, a fim de “vetar os maus candidatos que pretendem disputar as eleições municipais deste ano de 2012 para os cargos de prefeito, vice-prefeito ou vereador nas nossas cidades”.
Isto vale por apenas cinco (05) dias contados a partir da publicação do pedido de registro, portanto após 5 de julho fica possibilitado o direito de impugnar o registro. A publicação do pedido é feita no mural do Cartório Eleitoral ou no Diário da Justiça Eleitoral.
Os modelos de impugnação são direcionados contra aquelas pessoas que cometeram crimes eleitorais, tais como compra de votos, abuso de poder econômico ou uso da máquina pública em eleições, é contra aqueles que foram condenados por atos de improbidade administrativa, tais como fraude em licitações, contratação de servidor publico sem concurso ou uso de bens públicos em proveito próprio, ou para aqueles que tenham cometido crimes comuns. Veja as orientações sobre isto no site www.mcce.org.br .
FONTE: O artigo de Pedro Aguerre nos foi enviado diretamente pelo autor, tendo sido primeiramente veiculado pela Rádio 9 de Julho no dia 4 de julho de 2012. Sua reprodução é autorizada pela Rádio 9 de Julho. Título completo deste artigo: "Reflexões sobre Cidadania e Democracia às Vésperas do Início da Campanha Eleitoral Municipal"