No evangelho de João não encontramos a palavra “milagre “como é relatado nos outros e sim
a palavra “sinal”. Porque? João destaca sete sinais (milagres) para que as pessoas possam
penetrar no mistério da vida de Jesus e descobri-lo como verdadeiro Messias e Filho de Deus.
A leitura de hoje relata o quarto sinal.
Jo.6,1-4: Depois disso, Jesus foi para o outro lado do mar da Galiléia, também chamado
Tiberíades. Grande multidão seguia a Jesus, porque via os sinais que ele fazia em favor dos
doentes. Jesus subiu a montanha a aí sentou-se com seus discípulos. Estava próxima a
Páscoa, a festa dos judeus.
Jesus não é apenas quem cura, ele também é mestre: ele sobe a montanha e senta-se, na
atitude do professor quando ensina.
“Estava próxima a Páscoa, a festa dos judeus” Na Antiga páscoa, aquela do êxodo do Egito, o
povo atravessou o Mar Vermelho. Aqui na nova páscoa, Jesus atravessa o Mar da Galiléia. Uma
grande multidão seguia Moisés no primeiro êxodo. Uma grande multidão segue Jesus neste
novo êxodo. No primeiro êxodo, Moisés subiu a montanha. Jesus, o novo Moisés, também
sobe a montanha.
Jo.4,5-7: Jesus ergueu os olhos e viu uma grande multidão que ia ao seu encontro. Então
disse a Filipe: “Onde vamos comprar pão para que eles possam comer”? Jesus falou assim
para testar Filipe, pois sabia muito bem o que ia fazer. Filipe respondeu: “Nem o dinheiro de
duzentos dias de trabalho daria para comprar pão e cada um receber um pouco”.
No primeiro êxodo o povo sentiu fome e reclamou com Moisés. Aqui Jesus fica preocupado
com as pessoas que o estavam seguindo e questiona Filipe. O evangelho diz que era só para
provocar o discípulo, porque já sabia o que ia fazer. Como assim? O que João quer nos
ensinar? Conforme a Escritura, Moisés tinha conseguido alimento para o povo.
Jesus, o novo Moisés irá fazer a mesma coisa. Mas Filipe, em vez de olhar a situação à luz da
Escritura, olha a situação com os olhos do sistema e responde que era necessário muito
dinheiro para comprar pão para todos. Filipe constata o problema e reconhece sua total
incapacidade para resolve-lo.
Jo.6,8-10: Um dos discípulos de Jesus, André, o irmão de Simão Pedro, disse: “Aqui há um
rapaz que tem cinco pães de cevada e dois peixinhos. Mas, o que é isso para tanta gente”?
Então Jesus disse: “Digam para o povo se sentar”. Havia muita grama nesse lugar e as
pessoas se sentaram; eram cerca de cinco mil.
André, em vez de lamentar-se, busca uma solução. Encontra um garoto que está disposto a
partilhar cinco pães e dois peixes. André percebe que neste gesto do menino está a solução.
Por isso levou-o até Jesus. Parece que André acertou. Jesus esperava por isso. Ordena aos
discípulos que acomodem as pessoas.
A segurança da subsistência não está no muito que poucos possuem e retém para si, mas no
pouco de cada um que é repartido entre todos. O evangelista faz memória do profeta Eliseu
que recebe vinte pães de cevada e o distribui para cem pessoas... (2Rs.4,42-44) Se Eliseu fez
isso, Jesus pode muito mais!
Quem de nós não tem “cinco pães e dois peixes”? Todos nós temos! É só colocá-los nas mãos
do Senhor e ele certamente multiplicará os nossos gestos de solidariedade.
Jo.6,11-13: Jesus tomou os pães, agradeceu e distribuiu aos que estavam sentados. Fez a
mesma coisa com os pequenos peixes. E todos comeram o quanto queriam. Quando ficaram
satisfeitos Jesus disse aos discípulos: “Recolham os pedações que sobraram, para que nada
se desperdice”. Eles recolheram e encheram doze cestos com os pedações dos cinco pães que
sobraram do haviam comido.
Nas palavras iniciais escritas no ano 100 depois de Cristo, João faz memória do gesto da Ceia,
do jeito que era celebrada nas comunidades (1Cor.11,23-24). “Fazer Comunhão” significa
também obter de Cristo a graça que nos torna capaz de partilhar com os outros.
Jo.6,14-15: Quando as pessoas viram o sinal que Jesus tinha feito, disseram: “Este é
realmente o Profeta que vem ao mundo! ” Jesus, porém, percebeu que iam tomá-lo para
fazer dele um rei. Então se retirou sozinho, de novo, para a montanha.
A fartura do momento leva ao reconhecimento dele como Profeta esperado. Mas não se
esperem soluções fáceis. Não se trata de um simples milagre ou uma mágica realizada por
Jesus. E nem mesmo um milagre religioso que muitas igrejas saem pregando, iludindo o povo
com a multiplicação do dinheiro. Não se trata de uma teologia da prosperidade econômica em
nome de Deus. Trata-se do grande “Sinal” da partilha.
Não podemos projetar em Jesus expectativas que não são coerentes com o projeto que ele
está apresentando. Por isso Jesus se retira. A garantia da dignidade não se encontra no poder
de um líder que manda, mas no serviço de cada um que organiza a comunidade para o bem de
todos.
P/ CEBI (Centro Estudos Bíblicos) Raul de Amorim Pires