Pequena Reflexão sobre o Momento do País (2013-2014)

As retrospectivas e análises sobre o ano de 2013 não se mostraram conclusivas. Afinal de contas, o ano que termina, foi um ano ruim, mediano ou bom? Comparando o desempenho do País com o contexto internacional vê-se que o Brasil terá um crescimento mediano, semelhante à média global. Não está no grupo de maior crescimento, como a China, nem no outro grupo, que enfrenta grandes dificuldades. Muitas dificuldades vividas por estes últimos são decorrência das estratégias adotadas para enfrentar a grande crise de 2008, especialmente na Europa, que ainda continua gerando recessão e desemprego. No entanto, sabe-se que o contexto e as oscilações da conjuntura internacional são uma variável de grande importância para avaliar o desempenho dos países e suas perspectivas futuras.

E quanto à forma de termos alcançado este crescimento mediano? Está mais certo o enfoque que diz que as reformas e o alto custo Brasil impedem a competitividade e dificultam a inserção internacional do país? Ou é mais importante o fato de o País estar numa fase virtuosa, de baixíssimo desemprego e do aumento da renda e do consumo nos últimos anos? Neste aspecto, embora este ano tenha revelado avanços nas duas áreas, sabe-se que o melhor caminho será a melhor combinação possível entre as duas vertentes, atentando para riscos e problemas advindos de nossa inserção internacional, como câmbio, juros, competitividade das exportações etc.

Contudo, ao olhar o noticiário, não se vê o debate das grandes questões nacionais. Ao contrário, parece haver um esforço para rebaixar as expectativas da população e das empresas, reduzindo a confiança, desestimulando investimentos e provocando a falsa sensação de fracasso da economia, do País, do Governo. O melhor exemplo pode ser o do noticiário que se seguiu ao natal. A notícia repetida pelos grandes jornais e redes de TV de que o “Comércio tem o pior resultado no Natal em 11 anos” e de que “as vendas de Natal decepcionam”, simplesmente não condiz com o que se viu nas médias e grandes cidades, refletindo grandes aumentos das compras por internet e em Shoppings Centers, mostrando a força do mercado interno e do potencial de consumo, aumentando vários pontos percentuais em relação ao ano passado.

Com este exemplo quisemos mostrar que é sempre fundamental valorizar a análise crítica da realidade, considerando diversas visões, incluindo as percepções da população e suas vozes, vindas dos movimentos reivindicatórios, como os movimentos de junho de 2013, e as manifestações da sociedade civil organizada.

Voltando à análise e desafios para 2014, é impossível não destacar os grandes eventos da agenda nacional. Por um lado, a Copa do Mundo no Brasil. Esta iniciativa foi muito criticada nos últimos anos e teve seu prestígio abalado junto à opinião pública por razões tais como o autoritarismo da Fifa e a complacência governamental, pelos elevados investimentos públicos, somados a altos impactos sociais. Com tudo isto, no entanto, os dados indicam com razoável segurança que a parte mais importante das obras e construções indispensáveis para um bom evento estarão prontas. Tudo leva a crer que possamos fazer um belo evento de alcance mundial, ainda mais diante da expectativa de um bom desempenho da seleção brasileira.

Outra marca do período será o processo eleitoral, com a importante eleição que definirá os/as governadores/as e o/a presidente/a do País. Esta eleição renovará o Congresso Nacional e as Assembleias Legislativas, elegendo deputados estaduais e federais, bem como dois terços dos senadores. Esse processo é da maior importância para o País. A renovação do poder legislativo é a condição fundamental para a realização de reformas e mudanças mais profundas da realidade social de cada estado e do País.

Todos sabem, no entanto, que uma nova etapa de avanços institucionais da realidade social e política requer também uma maior presença da sociedade e da cidadania nos rumos da política. Além do destravamento dos mecanismos de participação previstos na Constituição de 88, como plebiscito, referendo e iniciativa popular de lei, que impedem a melhoria da nossa democracia participativa, é fundamental uma reforma política que melhore muito nossa democracia representativa, favorecendo partidos mais consistentes, maior representatividade dos políticos eleitos e menor influência do poder econômico.

Duas iniciativas populares em curso insistem nesse tema, que foi um dos principais focos das mobilizações de julho. A primeira é o movimento Eleições limpas e democráticas (www.eleicoeslimpas.org.br), que consiste em um abaixo assinado promovido por diversas entidades da sociedade civil, visando levar ao congresso um Projeto de Lei de aprimoramento do sistema eleitoral, pela via do fortalecimento dos partidos políticos e dos seus programas e da adoção do financiamento democrático de campanhas, proibindo o financiamento por empresas. No sistema atual, a sociedade tem a falsa percepção de que é possível combater a corrupção e aqueles nela envolvidos sem identificar e punir os principais interessados, os corruptores, que se utilizam da legislação vigente e financiam candidatos e partidos buscando facilidades e vantagens para suas empresas e fragilizando as instituições políticas.

A segunda iniciativa é o Plebiscito Popular por uma Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político, também assinada por dezenas de importantes entidades da sociedade civil. Trata-se de uma proposta de mobilização durante a semana da Independência, em setembro de 2014, para fortalecer a luta da sociedade por um sistema político e eleitoral mais justo e capaz de promover o bem comum, a partir da ideia (http://www.inesc.org.br).

Se o atual Congresso não mostrou a necessária ousadia de enfrentar esse debate, atendendo o clamor das ruas, dentro de sua responsabilidade, pouco se esforçando para alterar as regras vigentes em 2014, a sociedade civil e o conjunto da população terão muito trabalho pela frente, para assegurar novos avanços, na esteira de lutas como da Lei da Compra de Votos e da Ficha Limpa.

Enquanto isso não acontece, a questão da inconstitucionalidade das empresas financiarem as eleições tramita no Supremo Tribunal Federal, em resposta a uma representação feita pela OAB Nacional. Tendo havido alguns votos favoráveis, e logo depois sendo a votação interrompida por pedido de vistas, esperamos que a maioria dos sete ministros que ainda precisam votar siga na linha já estabelecida pelo Ministro Relator, no sentido da proibição de financiamento por empresas, permitindo transitar para formas mais democráticas de financiamento eleitoral. Acreditamos que o financiamento de partidos e políticos por empresas é um modelo muito ruim para a nossa Democracia. De fato, as manifestações de alguns ministros do STF tem mais uma vez mostrado como o sistema atual tem enorme parcela de responsabilidade na baixa qualidade de nossa política institucional. Se vier mesmo a ser confirmada a alegada inconstitucionalidade, vale ressaltar um argumento do Ministro Luis Roberto Barroso, ao afirmar que o ator que tem a responsabilidade de mudar as Leis e de fazer a Reforma Política é o Congresso Nacional, de preferência acolhendo e respeitando a vontade popular.

Muitos outros elementos poderiam ter sido enfatizados neste comentário de fechamento do ano de 2013. No entanto, preferimos destacar aspectos mais gerais e insistir na importância da participação da sociedade, buscando reforçar a cidadania ativa e o protagonismo da sociedade civil, de forma a construir melhores caminhos para o futuro do país, com a inclusão de todas e todos e com a ampliação dos espaços de participação.

 

Fonte: Programa exibido na Rádio 9 de Julho no Programa Igreja em Notícias em 01/01/2014. Artigo enviado ao nosso site diretamente pelo autor.